quinta-feira, 30 de junho de 2011

Há algo de chique no chiqueiro?

Faz alguns dias, perguntaram-me pelo formspring: "Professor, gostaria de saber de onde vem a palavra 'chiqueiro', no sentido de lugar onde se criam porcos... Obrigada!!!"

Do árabe shirkair, "cabana", chegando até nós por meio do castelhano chiquero. Esta é uma hipótese para designar a pequena habitação dos porcos. Já o chiqueirinho, ou cercadinho, é o móvel onde se colocam crianças pequenas. Nada a ver com pocilga, e existem chiqueirinhos bem chiques.

"Chique" é galicismo que já usávamos no final do século XIX. Mas chic, termo comum no mundo da moda, foi germanismo incorporado pelos franceses. Na Renânia e na Alsácia, usava-se a palavra schick, derivada do verbo schicken ("preparar", "pôr-se no caminho"). Uma pessoa chique está preparada, vestida com elegância, para sair. Por extensão, chique é tudo aquilo que se apresenta com requinte.

terça-feira, 28 de junho de 2011

Adolescentes, adultos e adjacências

Um leitor do blog perguntou sobre a origem da palavra "adolescente" e um amigo, sobre as raízes de "adulto". As duas palavras têm parentesco entre si.
O verbo latino adolescere refere-se ao que cresce e amadurece. O adolescente está em processo de crescimento. Nada a ver com "doença", como alguns inventaram. Ao contrário. O termo latino carrega em si os verbos alere ("alimentar") e alescere ("começar a se alimentar"), em consonância com "aluno", ou seja, aquele que é alimentado.

O adulto é o adolescente que amadureceu. Que já adolesceu, no sentido de ter ultrapassado a fase de crescimento, em geral quando se chega aos 21 anos.

A partir da década de 1950, a palavra "adulto" começou a ser empregada em expressões como "literatura adulta" e "filme adulto", associadas a algo indecente ou pornográfico. O que é curioso, porque os maiores interessados nesse tipo de literatura e cinema são os adolescentes e não os que já amadureceram realmente.

sábado, 18 de junho de 2011

Psiu! Sigilos!

Os dois sigilos "técnicos", por assim dizer, são o profissional e o sacramental (do confessionário católico).
O sigilo profissional é dever ético que médicos, advogados e qualquer profissional tem de cumprir quando isso envolve a intimidade e a honra de outras pessoas. O sigilo confessional tem de ser vivido pelo padre que, ouvindo o que ouvir no sacramento da confissão, deve manter segredo. O famoso filme I confess, dirigido por Hitchcock, em que Montgomery Clift interpreta o papel do sacerdote, mostra a seriedade da questão.

Conforme explico no livro Palavras e origens, "sigilo" deriva do latim sigillum, "pequeno sinal". Uma carta devidamente lacrada, selada, sob sinete — sub sigillum —, não podia ser violada.

A atual discussão em torno do "sigilo eterno" sobre fatos da história brasileira nos faz perguntar que tipo de sigilo transforma a política em religião. Não será direito nosso saber os pecados cometidos contra o Brasil?

sexta-feira, 17 de junho de 2011

Bolos, bolas e boleiros

Um amigo, leitor assíduo da coluna Boleiros do jornal Estado de S. Paulo, perguntou-me a origem da palavra em destaque.

A palavra "boleiro" tem vários significados ligados a bolas e bolos. Pode ser o fabricante de bolas, ou o comerciante de bolos. Pode ser o apanhador de bolas, o gandula, ou aquele que dá bolo (isto é, não vai a um compromisso). No jogo da roleta, é quem faz girar a bola.

"Bola" e "bolo" remetem ao latim bulla, em referência à bolha de ar que surge na superfície da água. Está em evidência a forma esférica. O bolo, em geral, tem esse feitio. A bolacha (o sufixo -acha mostra o pequeno tamanho da bola) é um biscoito de forma achatada, arredondada. Bolacha também designa aquele disco de papelão que serve como base para os copos de chope em bares e restaurantes, e um meio prático de registrar quantos foram consumidos pelo cliente.

Uma outra curiosidade: o verbo "bolar", no sentido de "planejar", "idealizar", "conceber", indica que a cabeça (essa bola que temos sobre os ombros) trabalhou.

sábado, 11 de junho de 2011

Dia dos Namorados: o amor que se enamora

No Dia dos Namorados, comemora-se o amor que se enamora. A palavra "namorado" equivale a "enamorado", que está formada pelo prefixo en (proveniente do in- latino), da palavra "amor" e do sufixo "ado" (do latim -atu, indicando o particípio passado).

O prefixo in expressava aproximação e/ou movimento para dentro e/ou transformação. O que poderia sugerir, no caso do "enamorado", três relações com o amor:
1) aproximação: como em "encostado" e "entestado", o en-amorado chega bem perto do amor; 2) movimento para dentro: como em "embarcado" e "encaixotado", o en-amorado entra no âmbito do amor; 3) transformação: como em "enriquecido" e "enxaropado", o en-amorado transfigura-se no próprio amor.

terça-feira, 7 de junho de 2011

— Vixe!

Um amigo nordestino, depois de ler sobre a etimologia de "chê" e "uai", perguntou-me sobre interjeição típica de sua terra: — Vixe!

Que pode ser também "ige" e "ixe", exprimindo espanto e surpresa, ou ironia, ou aborrecimento e menosprezo. No Grande Dicionário Sacconi, lemos:

Ixe (interj.) - Indica princ. admiração, surpresa, desprezo e ironia: que fogo é aquele? Ixe! é um incêndio!

"Vixe!" é forma popular que altera "Virgem!", que é forma reduzida da católica exclamação "Virgem Maria!". A palavra "virgem" remete a duas palavras latinas, virgo ("menina", "mulher nova", "ninfa") e virga ("ramo flexível", "ramo novo").

Anunciação, de fra Angelico (1387-1455)
A ideia da virgindade está ligada à força da natureza que acaba de vir à tona, à sua condição verdejante. Há o verbo latino vireo, "estar verde" e "ser vigoroso". Uma virens puella era uma menina "verde", ou melhor, uma mulher jovem e vigorosa, na flor da idade.

sexta-feira, 3 de junho de 2011

Etimoludia

Na edição de maio da revista Caros amigos, Marcos Bagno escreveu sobre etimologia. Afirmando que etimologia não é uma brincadeira qualquer. E que precisamos tomar cuidado com as informações pseudoetimológicas que pululam por aí, como dizer que "aluno" significa "sem luz" ou que "adolescente" tem a ver com "doença".

Ele está coberto de razão. E para denunciar as falsas origens etimológicas criou um termo: a "etimoludia". Em cuja formação temos a presença de étymon (do grego, "verdadeiro", "real", "certo") e de ludus (do latim, "jogo", "divertimento", "zombaria").

A etimoludia seria o exercício frívolo ou trapaceiro de quem não respeita o verdadeiro estudo da verdadeira origem das palavras.